Purgarção 1801

– Não pude ser sincera
 seria como dizer que os meninos
 não podem apreender o Sol
 E como eles não poderiam
 os Filhos de Deus
 Feitos à imagem e semelhança
 com suas peles brancas
 mãos pesadas
 sorrisos constantes
 cabelos claros
 corpos pesados
 Sobre o ventre da humanidade
 em contraponto da vontade
 flagelando as paredes
 louvando a si próprios
 amaldiçoando a espúria
 nudez inassimilável
 da mulher

Crianças-Sóis
 nunca encarando a si mesmos
 jamais a si mesmos

– Não pude ser sincera
 e negar a força do encontro

deixei que me queimasse
 e sorri enquanto ardia.

Na hora

Não sei a hora
Não preciso saber a hora.
A hora não faz café,
a hora não toma banho,
não manda e-mail ou bebe vinho.
A hora não gosta de vinho.
A hora pede.
A hora anseia
(quase nunca quer).
A hora gosta do agora,
só pra mandar.
A hora é conceitual
não consensual
(a hora não tem nada de sensual).
A hora não é a mesma,
dura o que se deixa.
A hora não sabe, mas quero mais que ela.
A hora não tem culpa, mas não pertenço a ela.
A hora só faz a gente se perder.

Pela manhã

acordei antes da hora
Sol nascia
já não era Tempo
pra pensar no ontem
que me-não-se-acaba

queriam-me insone
fui só sonhos
queriam-me sono
despertei alto
e aguda

pássaro na janela
desafinado
excitado
Fêmea

Gata manhosa
no cio
de dezembro a dezembro
quero colo

menina sem nexo
avante